sábado, 16 de agosto de 2008

A FAVORITA

Nas primeiras chamadas da novela A FAVORITA, de João Emanuel Carneiro, as personagens Flora e Donatela defendiam-se através de um texto idêntico e simultâneo, da acusação de assassinato que movimenta a atual trama das oito. De um lado Patrícia Pillar, eterna mocinha, cujo papel mais marcante fora a sofrida bóia-fria de O REI DO GADO, e que, segundo o site da própria novela, encarna Flora, uma mulher doce e solitária. Do outro, Claudia Raia, dona de uma série de personagens ambíguas e espalhafatosas, além de, no mínimo, uma vilã marcante (na novela TORRE DE BABEL), vivendo Donatela, uma pessoa de moral duvidosa, novamente segundo o perfil da personagem encontrado no site de A FAVORITA.
Passemos um pouco adiante. Mais especificamente a uma das chamadas de apresentação de elenco da trama, onde há um momento em que Donatela se diz uma santa e é prontamente retrucada pela sogra, personagem vivida por Glória Menezes: “Será mesmo?”.
Pronto. O espectador fora induzido, antes mesmo da estréia, a acreditar na inocência de Flora e na culpa de Donatela. Ao menos até os últimos capítulos que foram ao ar, onde numa já anunciada reviravolta, o autor revelara Flora como a grande vilã da novela das oito.
No entanto, espectador nenhum pode queixar-se de ter sido enganado. Os marcadores que traziam Flora como a assassina de A FAVORITA sempre estiveram presentes, seja na personalidade inconstante da personagem, seja nas palavras do próprio autor, que desde o princípio prometera uma reviravolta revelando assim a verdadeira assassina. Pensando por esse raciocínio, pendendo a culpa para o lado de Donatela, correr-se-ia o risco de recorrer a um artifício fácil e cômodo demais, afinal, aos olhos do grande público ela era a assassina. Ou seja, para não perder o fator surpresa, Carneiro transforma a então considerada mocinha em vilã, e inicia a desconstrução de uma série de preconceitos e antipatias criados em torno daquela que até então se considerava a antagonista.
Assim sendo, A FAVORITA pode estar longe de ser uma revolução teledramaturgica, mas conta com um mérito e uma ousadia que poucas novelas hoje conseguem alcançar (talvez as de Silvio de Abreu e Gilberto Braga, mas ainda assim talvez): dar alguma ambigüidade a um produto onde geralmente as coisas são sempre claras e didáticas.
por ALVARO ANDRÉ ZEINI CRUZ

Nenhum comentário: