quinta-feira, 29 de maio de 2008

INDIANA JONES E O REINO DA CAVEIRA DE CRISTAL

Se há algo a se destacar no retorno da franquia INDIANA JONES quase vinte anos após seu término, é a extrema necessidade de reafirmar a vivacidade de Harrison Ford, hoje um ator sexagenário, como protagonista da série. Não por menos, já que as dúvidas quanto à anunciada retomada da franquia nunca foram poucas, e muito menos irrelevantes: será que Ford teria vigor físico para retomar o arqueólogo aventureiro que alavancara sua carreira há mais de duas décadas? E se caso a resposta fosse positiva, será que isso soaria verossímil ao grande público? Steven Spielberg e George Lucas apostaram que sim, e ainda bateram na tecla de que Ford continuava o mesmo mocinho de outrora. é, portanto, interessante notar que INDIANA JONES E O REINO DA CAVEIRA DE CRISTAL traga o personagem-título com uma imagem dissociada daquela criada em torno de seu intérprete: embora não menos heróico, Indiana Jones surge aqui como uma figura consciente e conformada de que os anos passaram, e não raramente apresenta rabugice e melancolia típicas da idade.No entanto, é preciso deixar claro que tais características jamais empobrecem o personagem. Muito pelo contrário; Spielberg e Lucas estão repletos de razão em afirmar que Ford é a própria franquia, já que seu personagem continua sendo fascinante, e sua energia ao interpretá-lo não fica devendo em nada àquela vista nos episódios anteriores. Não à toa, o protagonista sobrepõe à presença do elenco secundário (com exceção de Cate Blanchett e Karen Allen, as presenças femininas do filme) e Shia LaBeouf, o novo queridinho da América, surge apenas como uma figura engraçadinha, mas ainda assim incapaz de ofuscar qualquer brilho do herói original.Com Harrison Ford a todo vapor, o grande problema desse quarto episódio acaba sendo a própria narrativa, que parece indecisa entre querer apenas homenagear a série clássica ou integrar-se definitivamente a ela. Assim, a primeira metade de O REINO DA CAVEIRA DE CRISTAL é visivelmente calculada para despertar certa nostalgia ao público, o que acaba criando uma artificialidade incômoda. Mas a aventura se redime da metade para frente, quando opta por mergulhar no universo fantástico e descomprometido que marcou a série.Contrariando a tendência realista inaugurada pela trilogia BOURNE, assim como os apetrechos tecnológicos de A LENDA DO TESOURO PERDIDO (que nada mais é do que um Indiana Jones sem charme) INDIANA JONES E O REINO DA CAVEIRA DE CRISTAL pode não ter o mesmo brilho da trilogia clássica, mas apenas porque perde um tempo precioso tentando espelhar-se nela. Torna-se, porém, um filme suficientemente divertido quando deixa de formalidades e entrega-se aos prazeres do absurdo. Trata-se, assim, de um bem-vindo intervalo em meio a um cinema valorizador da verossimilhança e elimina a dúvida que não quis calar: para Indiana Jones, quanto mais passam os anos, melhor!
por ALVARO ANDRÉ ZEINI CRUZ

domingo, 11 de maio de 2008

GO, SPEED, GO!

Têm-se falado aos montes que o chimpanzé Zequinha é o grande astro de SPEED RACER. Os irmãos Wachowski parecem concordar com tal opinião, já que seu longa, baseado no anime dos anos 60, desperdiça boa parte do tempo centrando-se na dupla formada pelo animal de estimação e pelo irmão caçula (vivido por Paulie Litt) do protagonista. Uma pena, pois o que falta ao filme é justamente a presença de um protagonista bem estruturado, algo que justifica a interpretação apática de um ator talentoso como Emile Hirsch.
Ainda assim, SPEED RACER tem lá seus méritos, e acreditem, não são poucos. O maior deles acaba nem sendo uma grande surpresa, já que, num filme dirigido pelos Wachowski, responsáveis pela trilogia MATRIX, um visual arrojado era, no mínimo, esperado. A simplicidade, o clean, as cores pastéis vistas no desenho original, aqui dão espaço a um mundo de curvas e cores fortes, que beiram a psicodelia. E falando em curvas, as pistas de corrida que servem de cenário ao filme, mais parecem imensas montanhas-russas, o que aumenta ainda mais a tensão das cenas.
Com um início intenso e ousado, onde personagens são apresentados através de flashbacks já no meio da ação, SPEED RACER diminui o ritmo em seu desenrolar, voltando a acelerar apenas em seu clímax que, é claro, é centrado nas mais perigosas disputas automobilísticas.
Protagonizado por Emile Hirsch, o filme falha em desperdiçar não apenas o talento do ator protagonista, como também o de Matthew Fox, que faz o misterioso Corredor X. Em contrapartida, conta com as presenças sempre acertadas de Susan Sarandon, Christina Ricci (que exibe uma energia simplesmente contagiante no papel da mocinha Trixie) e, sobretudo, de John Goodman, que cria o personagem mais bem estruturado da trama, além de manter um forte elo emocional com o filho Speed, o que acaba fortalecendo, ao menos um pouco, o protagonista.
Contando com uma edição curiosa, que usa e abusa de cortinas (o que acaba tornando o efeito exaustivo), SPEED RACER apresenta uma série de transições interessantes que, em determinados momentos, remetem aos clássicos cartoons e seriados dos anos 60, o que enriquece ainda mais a homenagem feita ao produto original.
Mesmo apresentando uma série de falhas narrativas, SPEED RACER agrada graças a sua leveza e descomprometimento e, definitivamente, seduz através do visual. Ficam “sobrando” apenas o garoto e o macaco, que divertem a princípio, mas acabam se tornando um artifício fácil com o decorrer da trama. E convenhamos, se a intenção fosse ver tal dupla improvável, era mais acertado correr até a locadora e alugar algo do tipo O HÓSPEDE QUER BANANAS.

por ALVARO ANDRÉ ZEINI CRUZ

quinta-feira, 8 de maio de 2008

HOMEM DE FERRO

Está aberta a temporada de blockbusters. Nos próximos finais de semana, e muito provavelmente até o final de julho, SPEED RACER, BATMAN, INDIANA JONES e cia. invadem as telas, e se todos mantiverem o vigor do abre-alas HOMEM DE FERRO, a pipoca está garantida no mínimo até as próximas férias.
Estrelado por Robert Downey Jr. e considerado o retorno do ator as grandes produções após seu envolvimento com drogas (o que não significa que ele esteve ausente de grandes filmes, afinal fez ZODÍACO ano passado), HOMEM DE FERRO não é o melhor ou o definitivo filme de super-heróis, mas tem sua cota de pequenas ousadias e o talento único de não se levar a sério, algo que combina perfeitamente à construção de seu protagonista.
Contrariando boa parte dos heróis importados dos quadrinhos, Tony Stark (Downey Jr.) é um bilionário fabricante de armas que tem como características marcantes um senso de humor ácido e um certo cinismo disfarçado. Vítima de um seqüestro comandado por terroristas afegãos, país onde demonstra a força de um novo míssil desenvolvido por sua empresa, Stark conta com aquele que talvez seja seu principal “superpoder” para fugir do cárcere: é dono de uma inteligência invejável e passa o tempo em que é mantido como refém planejando uma armadura suficientemente poderosa para resistir ao poder de fogo (fabricado por ele próprio) de seus seqüestradores.
Mas há ainda um diferencial capaz de fazer com que o protagonista se sobressaia perante seus tantos outros companheiros combatentes do mal. Em HOMEM DE FERRO não há aranhas ou mal sucedidas experiências de laboratório: tal como Bruce Wayne, de BATMAN, a imagem e o poder de Tony Stark como super-herói são integralmente criados e financiados pelo próprio personagem, o que o torna um mocinho ainda mais verossímil e interessante.
Abrindo a trama com agilidade e energia, o diretor Jon Favreau toma caminhos ousados durante o primeiro ato de HOMEM DE FERRO, já que sua escolha em centrar o início da história no seqüestro do protagonista, revela-se não apenas narrativamente acertada, como ainda contextualiza o surgimento do herói num cenário político atual, tangenciando assim, ainda que com menos fervor, algumas críticas feitas por Mike Nichols no excelente JOGOS DO PODER.
Assim, é uma pena que, passada a euforia inicial, HOMEM DE FERRO se entregue tão facilmente a já batida cartilha do gênero, com direito as figuras da mocinha indefesa e do padrasto traiçoeiro (que, embora estereotipados, são impecavelmente vividos por Gwyneth Paltrow e Jeff Bridges) e a outra meia dúzia de clichês que só são perdoáveis graças ao roteiro bem-humorado e a espirituosa presença de Robert Downey Jr. (e chegamos aqui no principal ponto a se destacar).
Embora seja um sujeito cínico, levemente convencido e, em alguns momentos, arrogante, é impossível deixar de sentir certa simpatia por Stark, seja ela causada por seu súbito desejo de reparar os males criados por sua empresa ou por seu humor afiado, repleto de boas sacadas. O fato é que Robert Downey Jr. acaba sendo bastante feliz em sua interpretação, principalmente por dar a um personagem quase que canastrão, um mínimo de complexidade (a cena em que Stark faz uma revelação bombástica durante uma coletiva de imprensa contraria tudo aquilo esperado de um bom super-herói, além de ser engraçadíssima).
Para os que curtem histórias em quadrinhos, HOMEM DE FERRO certamente é um prato cheio. Para os que não gostam, também. Mas é, sobretudo, um pontapé eficiente para uma franquia que demonstra ter fôlego para pelo menos mais algumas histórias.
por ALVARO ANDRÉ ZEINI CRUZ

sábado, 3 de maio de 2008

NA NATUREZA SELVAGEM

Em NA NATUREZA SELVAGEM (INTO THE WILD), um poderoso embate é reincidente trama a fora. De um lado, o cotidiano limitado de uma típica família de classe média norte-americana; do outro, a imensidão de um mundo inimaginável a ser explorada. Em comum, um jovem que transita entre os dois cenários e que, cansado principalmente da hipocrisia familiar, resolve deixar tudo para trás e embarcar “sem lenço, nem documento” numa aventura mundo a fora, sobrevivendo apenas do que a natureza lhe proporciona. O confronto, embora inicialmente velado, é claro, e a competência com que o diretor Sean Penn transita entre esses dois universos faz com que o filme vá além de um “road movie” tradicional.
Protagonizado por Emile Hirschy, NA NATUREZA SELVAGEM é baseado na história verídica de Christopher McCandless que, recém-formado, deixou para trás uma conturbada vida familiar e partiu numa busca por si próprio em meio a uma viagem sem grandes recursos rumo ao Alasca. Contando apenas com utensílios básicos para a jornada, McCandless, sob o pseudônimo de Alexander Supertramp, livrou-se aos poucos dos únicos bens materiais levados consigo durante a viagem, e encontrou pelo caminho personagens indispensáveis para cada momento de tal empreitada.
Contudo, a cada passo do protagonista rumo a seu destino final, mais seu objetivo principal cai por terra e percebemos como único e verdadeiro objetivo do personagem o simples desejo de vingar-se dos pais (vividos por William Hurt e Márcia Gay Harden) pelos traumas causados a ele e a irmã durante a infância.
Narrado em voz off pela talentosa Jena Malone (que faz a irmã de McCandless), NA NATUREZA SELVAGEM traz uma narrativa dividida que alterna a viagem do protagonista a outros momentos reveladores das causas dessa jornada. Tal recurso, auxiliado pela primorosa direção de Sean Penn, faz com que a trama seja incapaz de tornar-se episódica, uma armadilha comum aos filmes do gênero, auxilia no já citado embate entre os dois mundos da trama e ao mesmo tempo em que dá a jornada de McCandless uma visão onisciente, percorre um caminho inverso durante os momentos em que o passado do protagonista é contado, já que a irmã compartilha com McCandless essa parte da história.
A direção de Sean Penn mostra-se ainda mais acertada na exploração desses dois universos: ao mesmo tempo em que consegue tirar performances comoventes e intimistas de seus atores, concentrando sua câmera em detalhes, ele explora com igual talento a beleza e imensidão de suas locações e a presença de seus personagens em meio a elas.
Contando com atuações contidas, mas ainda assim comoventes de William Hurt, Catherine Keener, Brian Dierker (um não-ator), Vince Vaugh e Hal Holbrook (indicado ao Oscar pelo papel), NA NATUREZA SELVAGEM peca apenas pela atuação de Márcia Gay Harden, que mais uma vez surge caricata no papel de uma mulher perturbada que vive de aparências (ela já havia enveredado pelo mesmo caminho em SOBRE MENINOS E LOBOS).
Mas o grande nome a se destacar é o de Emile Hirsch, já que, mais do que uma visível transformação física, o personagem vivido pelo ator exige maturidade principalmente pelas transformações psicológicas que sofre com o desenrolar da trama: enquanto o jovem idealista do início do filme é apenas um menino, a última cena traz um homem que reviu conceitos, aprendeu a perdoar, e ainda assim viu-se derrotado numa batalha contra aquela que de aliada tornou-se rival.
NA NATUREZA SELVAGEM revela-se assim um filme de não apenas um único embate, mas sim de vários. O embate entre pais e filhos; o embate entre o menino e o homem; o embate entre o homem e a natureza, por muitas vezes dona de uma força esmagadora e brutal. Por fim, a redenção. Não fosse por ela NA NATUREZA SELVAGEM seria apenas mais um filme sobre um idealista que desafia o Sistema. Mas no filme de Sean Penn há redenção; e é isso que o torna tão poético, belo e universal e o eleva a patamares de obra-prima.

por ALVARO ANDRÉ ZEINI CRUZ