sexta-feira, 24 de abril de 2009

QUEM QUER SER UM MILIONÁRIO?

É impossível permanecer inerte ao “melhor filme de 2008” tendo este chegado ao circuito nacional acompanhado de inúmeras críticas, algumas dissonantes, como a de Sylvia Colombo, da Folha de São Paulo, contra uma maioria convergente, dentre as quais encontram-se a de Marcelo Miranda, da Filmes Polvo (cujo título sugestivo é “Quem Quer Ser um Milionário? e seu mergulho na merda”), e talvez a mais ferina delas escrita por Inácio Araújo, um dos mais importantes nomes da crítica cinematográfica atuantes no Brasil, também da Folha de São Paulo.
O fato é que tanto Marcelo quanto Inácio são eficazes e coerentes em pontuar as irregularidades de uma obra cuja moral e a ética são visivelmente tortuosas. QUEM QUER SER UM MILIONÁRIO? traz em seu cerne narrativo a típica fábula de superação protagonizada por um indivíduo lançado na conhecida jornada do herói. Até aí nada fora do comum, não fosse um único porém: para chegar ao prêmio de 20 milhões de rúpias de um programa televisivo, o jovem indiano Jamal terá que “mergulhar” (e pode-se dizer que literalmente) numa trajetória cuja degradação é o mínimo a se esperar, ou seja, para chegar ao topo, ele terá antes que passar pelo fundo do poço. Marcelo Miranda pontua certo, portanto: a sequência do mergulho nada mais é do que a síntese de uma obra que potencializa essa diferença entre patamares ocupados pelo herói.
Mas há algo que joga ao mesmo tempo contra e a favor de QUEM QUER SER UM MILIONÁRIO?: o simples fato dele ser o que se apelida de “filme de roteiro”. Tudo é o mais simplório possível: sempre que Jamal chega a uma nova etapa do programa, a narrativa retorna ao passado do protagonista e revela a resposta, delimitando-se assim a ação dramática crescente e seus respectivos turn-points. Tudo se torna rapidamente óbvio e assim inicia-se uma operação inconsciente de desmascaramento do artifício: o roteiro visivelmente perneta exacerba ao receptor (o público) meio que sem querer o jogo de manipulação que se dá através do filme. Cria-se uma dupla possibilidade de reações: a de um total afastamento por parte desse receptor, abrindo-se assim a possibilidade de um olhar mais crítico perante a obra, ou a simples experiência de observar uma história de forma descompromissada (fazendo com que ela se torne esquecível em 5 minutos) ignorando todo o discurso que há por trás da narrativa. Pode-se dizer assim que a transparência fílmica é quebrada pela potencialização dos inúmeros artifícios presentes no conto de fadas pop de Danny Boyle e isso, bem ou mal, atenua um pouco a culpa de um filme cuja visão é tão equivocada quanto a forma com que ele tem sido visto tanto por seus defensores, como por seus inquisidores. QUEM QUER SER UM MILIONÁRIO? torna-se, portanto, um filme melhor graças à sua incompetência em manipular o espectador.

por ALVARO ANDRÉ ZEINI CRUZ