quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

JUNO

JUNO vem sido exaustivamente chamado de LITTLE MISS SUNSHINE do ano (inclusive por este blogueiro que aqui escreve). Mas será que tal comparação é mesmo justa? Sim, o longa de Jason Reitman, se assemelha muito ao dirigido por Jonathan Dayton e Valerie Faris, já que ambos se baseiam naquilo que têm de mais precioso, para contar histórias que, com sutileza e bom humor parecidos, são retratos bem mais ambiciosos do que os aparentemente propostos a princípio.
Mas não se engane: por mais parecido que possam ser os produtos, suas fórmulas são bastante distintas em sua posologia. Assim, enquanto MISS SUNSHINE abranda sua deliciosa acidez através de muita doçura, JUNO percorre justamente o caminho inverso; dá a sua trama aparentemente doce, altos toques de sarcasmo e alguns requintes de crueldade. Acaba revelando-se em seu desenrolar, uma obra dolorosa que, não só faz críticas à instituições como a família e o casamento, como vai além, tocando em questões mais profundas como a juventude e o tédio.
Perguntando-se ainda qual a maior preciosidade de JUNO? Fácil, o mesmo que LITTLE MISS SUNSHINE tinha de melhor, um roteiro primoroso. Incrivelmente bem lapidado, o script escrito pela ex-streapper Diablo Cody é uma verdadeira jóia por desdobrar a fundo uma história aparentemente simples, transpô-la para o atual universo adolescente e habitá-la com figuras complexas, que vividas com grande afinco pelo elenco, dão vida aos diálogos espertos criados pela roteirista.
Sempre focando o relacionamento da adolescente Juno (Ellen Page), com os demais personagens de seu universo limitado (afinal, ela é apenas uma garota interiorana que, aborrecida pelo tédio, resolve transar com o melhor amigo), o roteiro trilha caminhos interessantes e constrói relações poderosas, como o amor maduro e sincero (embora envergonhado) que a protagonista sente pelo melhor amigo e pai de seu filho Paul Bleeker (Michael Cera). Há ainda uma melhor: a amizade dela com pai adotivo de seu bebê. Controlado pelas vontades da esposa Vanessa (Jennifer Garner), não demora para que o até então aparentemente feliz e bem-casado Mark (Jason Bateman) se apaixone por Juno, e é justamente aí que o filme toca numa questão crucial. Mais do que se apaixonar pela própria Juno, o frustrado compositor apaixona-se, sobretudo pela juventude, pela rebeldia, e por que não dizer, pela excentricidade da garota, que prestes a dar a luz, trata o assunto sem grande importância.
Se por um lado JUNO retrata o deslumbramento que essa irresponsabilidade adolescente possa vir causar, por outro, traz uma geração de adolescentes que sem grandes motivações, permanece presa ao aborrecimento e a acomodação. Trazendo o tédio como desculpa para o sexo entre a protagonista e o amigo, aliado a passividade da personagem vivida por Jason Bateman, o filme de Jason Reitman, assemelha-se aí ao também independente RETRATOS DE FAMÍLIA, de Phil Morrison, que coincidência ou não, trazia em sua trama personagens passivas que tinham suas vidas mudadas por uma gravidez indesejada.
Repleto de boas atuações, JUNO destaca Michael Cera (SUPERBAD), vivendo o tímido e desajeitado Paul Bleeker, como um nome a se dar atenção, e reafirma o talento já conhecido da jovem Ellen Page (MENINAMÁ.COM). Indicada ao Oscar por sua atuação, Page faz sua mocinha oscilar entre o excêntrico e o adorável. Seu jeito debochado é capaz de fazê-la despejar as mais difíceis verdades através da boca, e é isso que faz dela uma personagem de tamanha complexidade.
Em JUNO, tudo o que sua protagonista quer é seguir adiante, seja lá do que tenha que abrir mão. Assim, em determinado momento quando têm seus planos quase que arruinados, a garota estaciona o carro e chora, enquanto um trem segue a todo vapor no outro canto da pista. Ela se recompõe e segue adiante. JUNO é assim, dono de um otimismo desconcertante e cruel, daqueles que te faz crer que só há final feliz se houver dor.

por ALVARO ANDRÉ ZEINI CRUZ

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