Numa cena de “Amor”, Georges (Jean-Louis
Trintignant) implora para que se converse outro assunto que não a doença da
esposa Anne (Emmanuelle Riva). A filha (Isabelle Hupert) então se vira e acerta
a bordoada: “E vamos falar sobre o que?”. Em seu novo filme, Haneke deixa a
pergunta: será que o amor é capaz de sobreviver ao tempo? Não esse tempo das
coisas cotidianas, do desgaste natural das relações, mas o tempo em sua veia
mais implacável, cuja a ação nefasta faz com que a personagem de Riva definhe
aos poucos entre os urros de dor. Haneke filma esse processo com rigorosos
planos estáticos, abertos, com os tempos dilatados, para que se possa ver o
lento definhar dos corpos a cada transferência da cadeira de rodas para cama, a
cada tentativa de higienização ou alimentação. Corpos que se esvaem emoldurados
por aquele apartamento que pouco a pouco perde vestígios de vida para se
transformar num mausoléu. A transformação da esposa rebate no próprio Georges,
e a atitude extremada a certo ponto deixa a questão: foi por amor à ela ou a si
próprio? Haneke intitula “Amor” um filme cujo objeto pulsante é a morte. A fala
da filha se alia à posição do filme: naquele momento, não há mais sobre o que falar;
a vida se resume à espera e à dor e ponto. Claro que é cruel e pessimista, mas
até aí, nada de novo no cinema, ou pelo menos na parcela do cinema que conheço de Michael Haneke.
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