quarta-feira, 1 de outubro de 2008

LINHA DE PASSE

Dênis, Dário, Dinho e Reginaldo. Quatro irmãos presos a uma movimentação cíclica e constante. Um deles se diferencia dos demais. Reginaldo não compartilha a semelhança de nomes dos irmãos, dorme no sofá, é negro e o único a viver o período da infância. É também o único a estar a favor de algo. Dênis luta contra o desemprego, Dário contra a idade, Dinho contra a delinquência. Reginaldo luta a favor, em busca de alguma coisa. Mais uma vez, a identidade paterna é colocada em xeque. Para Reginaldo, ela é capaz de interferir na dele própria. Essa diferença entre buscas e lutas difere Reginaldo dos outros três. Junto a ele, apenas a mãe, que movimenta-se de forma particular dentro da trama.
Dirigido por Walter Salles e Daniela Thomas, LINHA DE PASSE traz a idéia de um movimento incessante, algo recorrente pelo menos na carreira de Salles, responsável pelos road movies CENTRAL DO BRASIL e DIÁRIOS DE MOTOCICLETA. A busca pela figura do pai, vem de CENTRAL DO BRASIL, onde o garoto Josué (Vinícius de Oliveira) saía Brasil afora à procura dessa identidade perdida. Josué e Reginaldo dividem esse incômodo que os irriquieta, e a viagem de Josué nada mais é do que aquela que Reginaldo inicia em determinado momento do filme. A diferença é que em CENTRAL DO BRASIL essa procura significa uma completa libertação. Em LINHA DE PASSE também, mas uma libertação que se restringe a Reginaldo, sem atingir os demais pergonagens, embora tangencie aos outros três. Para a mãe Cleuza (Sandra Corveloni) a idéia de libertação é utópica e distante. Cleuza está presa ao mesmo ciclo do qual os filhos lutam para se libertar. Reginaldo é o único que consegue, talvez pela fé inocente mantida em sua jornada, talvez por um lance de pura sorte.
Essa idéia cíclica tem efeitos ambíguos no filme de Salles e Thomas. Se por um lado potencializa o filme, mantendo seus personagens fixos às suas tragédias diárias, por outro compromete quando se acovarda e nega a libertação aos outros três irmãos, um rompimento necessário à obra, seja ele para o bem ou para o mal. Se para Reginaldo esse rompimento significa algo novo, o que não necessariamente quer dizer um rumo bom ou feliz à sua história, para os outros, isso até chega a ser sugerido, mas acaba negado, e Dênis, Dário e Dinho ficam presos à Cleuza, a figura materna, e à periferia paulistana. Cenário esse que foge ao lugar comum do morro carioca, mas que não tem seu potencial totalmente explorado.
Em LINHA DE PASSE, os personagens transitam e perambulam por São Paulo, mas jamais a vivem intensamente. A cidade, por sua vez, desperdiça a chance de tornar-se personagem marcante dentro da obra, resignando-se a ser apenas cenário, localidade que abriga a trama. Num filme onde a movimentação se sobressai, a maior cidade do país não tem seu fluxo caótico e constante retratado da maneira que poderia. LINHA DE PASSE perde ao não levar esse movimento a uma camada extra. Ainda assim, tem méritos trazidos por cinco grandes interpretações, que dão vida a figuras magistralmente concebidas no que diz respeito à construção de um personagem.


por ALVARO ANDRÉ ZEINI CRUZ

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